Muitos prefeitos têm buscado consultorias privadas formadas por assessores ou ex-assessores de parlamentares para facilitar a liberação de emendas parlamentares. Uma investigação identificou que ao menos dez empresas foram contratadas por 210 municípios, gerando um faturamento de R$ 17 milhões desde 2019.
Levantamento do GLOBO com base nos portais de transparência e dos tribunais de contas estaduais identificou dez empresas do tipo, contratadas por 210 municípios
Essas consultorias atuam como intermediárias para negociar recursos entre prefeituras e congressistas. A prática de pagar a funcionários de gabinetes para este serviço é vedada por lei, podendo resultar em sanções. As Câmaras legislatórias destacam que esse tipo de atuação representa conflito de interesses.
O serviço oferecido funciona como o de um corretor, intermediando a negociação do gestor municipal com o congressista. Na prática, a prefeitura paga a funcionários de gabinetes da Câmara e do Senado para ajudá-los a receber verbas públicas sob responsabilidade de seus chefes.
Zanotelli e Borges Ltda, uma consultoria de destaque, fechou contratos com cidades do RS. Seus sócios, que também são assessores de um senador Heinze, declaram que suas atividades empresariais estão separadas de seus cargos públicos, embora o senador tenha pedido o desligamento deles da empresa.
A companhia tem como sócios Tiago Zanotelli e sua mulher, Ione Rosa Godoy Zanotelli. Os dois são assessores do senador Luis Carlos Heinze (PP-RS), com salários de R$ 22,5 mil e R$ 21,4 mil, respectivamente. Os acordos com as prefeituras, por sua vez, já renderam R$ 1 milhão à firma do casal.
Heinze negou que sabia da dupla função dos assessores e, após o contato, disse ter pedido aos dois que se afastem da empresa, caso contrário serão demitidos. O casal trabalha no gabinete desde 2019.
Em outros casos, deputados como Covatti Filho também alocaram recursos para municípios que contrataram consultorias ligadas a ex-assessores. A empresa Cuidar Consultoria, ligada ao deputado, foi beneficiada com repasses a cidades e tem entre seus sócios parentes do parlamentar.
Parlamentares citados alegaram desconhecer a extensão das ações de seus assessores e, em alguns casos, destacaram o desligamento destes das consultorias. Afirmaram priorizar o atendimento às demandas das prefeituras sem ligação direta com as consultorias.
— Só neste ano mandei recursos para mais de cem municípios. Eu não atendo à consultoria, atendo aos prefeitos que são meus aliados. Não vejo problema.
Embora as contratações não sejam ilegais per se, a mistura de funções públicas e interesses privados levanta questões éticas e legais. A Câmara e o Senado reafirmam que qualquer envolvimento direto de assessores em negócios que gerem vantagem é passível de investigação e punição. O advogado Marçal Justen Filho destaca que a falta de critérios objetivos na liberação de emendas contribui para essas situações conflitantes. (O Globo)